Brasília (DF), 11 de junho de 2002.
ASSUNTO: Exercício da profissão de nutricionista. Atividades de docência e de direção, coordenação e supervisão de cursos na área de Nutrição – atividades profissionais privativas de nutricionistas. Registro profissional – requisito para o exercício das atividades privativas pelos nutricionistas. Procedência da exigência, feita aos docentes e aos dirigentes de cursos de graduação em Nutrição, de registro nos Conselhos Regionais de Nutricionistas. Disposições expressas das Leis n° 6.583 e n° 8.234, que se encontram em harmonia com a Constituição do Brasil.
Consultas
O CFN recebeu consultas sobre o exercício da docência e da direção, coordenação e supervisão dos cursos de graduação nas áreas de alimentação e nutrição por Nutricionistas. Essas consultas foram sintetizadas nas seguintes questões:
I) As atividades de ensino de matérias e disciplinas relacionadas à alimentação e à Nutrição são privativas de nutricionistas?
II) As atividades de direção, coordenação e supervisão de cursos nas áreas de Nutrição são privativas de nutricionistas?
III) Os docentes e os diretores, coordenadores e supervisores de cursos de graduação em Nutrição estão sujeitos ao registro nos Conselhos Regionais de Nutricionistas e ao cumprimento de obrigações decorrentes desse registro?
Respostas
I) DA LEGISLAÇÃO
O CFN inicialmente traz à tona disposições constitucionais que vão orientar o exame da matéria e as respectivas conclusões. Assim os seguintes dispositivos da Constituição de 1988, verbis:
“Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:
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II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
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XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
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A Lei n° 6.583, de 20.10.1978, que tratou da criação e funcionamento dos Conselhos Federal e Regionais de Nutricionistas, dispõe o seguinte:
“Art. 1º. Ficam criados o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Nutricionistas com a finalidade de orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de nutricionista, definida na Lei n° 5.276, de 24 de abril de 1967.”
“Art. 10. Compete aos Conselhos Regionais:
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III – fiscalizar o exercício profissional na área de sua jurisdição, representando às autoridades competentes sobre os fatos que apurar e cuja solução ou repressão não seja de sua alçada;
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“Art. 15. O livre exercício da profissão de nutricionista, em todo o território nacional, somente é permitido ao portador de Carteira de Identidade Profissional expedida pelo Conselho Regional competente.
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“Art. 18. O pagamento da anuidade ao Conselho Regional da respectiva jurisdição constitui condição de legitimidade para o exercício da profissão ou para o funcionamento da empresa.”
A Lei n° 5.276, de 24.4.1967, que antes regulara o exercício da profissão de nutricionista, foi substituída pela Lei n° 8.234, de 17.9.1991. Desta nova Lei cabem aqui os seguintes destaques:
“Art. 1º. A designação e o exercício da profissão de Nutricionista, profissional de saúde, em qualquer de suas áreas, são privativos dos portadores de diploma expedido por escolas de graduação em nutrição, oficiais ou reconhecidas, devidamente registrado no órgão competente do Ministério da Educação e regularmente inscrito no Conselho Regional de Nutricionistas da respectiva área de atuação profissional.
……………………………………………………………………………………………….”
“Art. 3º. São Atividades privativas dos nutricionistas:
I – direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação em nutrição;
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IV – ensino das matérias profissionais dos cursos de graduação em nutrição;
V – ensino das disciplinas de nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins;
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“Art. 5º. A fiscalização do exercício da profissão de Nutricionista compete aos Conselhos Federal e Regionais de Nutricionistas, na forma da Lei n° 6.583, de 20 de outubro de 1978, ressalvadas as atividades relacionadas ao ensino, adstritas à legislação educacional própria.”
II) DO EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA PELOS NUTRICIONISTAS
Antes de serem examinadas as circunstâncias que conferem privilégio para o exercício da atividade de docência por parte dos nutricionistas, impõe-se avaliar a questão sob um aspecto de generalidade.
Diversas normas legais reservam a determinadas categorias de profissionais o exercício de certas atividades em caráter exclusivo. Referidas normas não fazem reserva desta ou daquela atividade, a determinado segmento de pessoas, só porque os respectivos membros tenham formação acadêmica específica com ela correlata. Isto porque a lei não dedica interesse especial a segmentos destacados, no que não se cogita que pudesse reservar atividades para determinado grupo com o fim único de beneficiá-lo ou de distingui-lo dos demais.
Quando a lei confere reserva para o exercício de certas atividades, o objetivo perseguido é o fim da atividade em si mesma, qual seja: que ela atinja com correção a conseqüência que o esforço humano deve proporcionar de modo eficaz. Há, portanto, que se atingir um resultado útil, proveitoso para o destinatário da atividade e eficiente para o fim a que ela se destina.
A ocorrência de privilégio para o exercício da atividade profissional, qualquer que seja a profissão, impõe então a conjugação de três fatores: (1°) a existência de uma atividade técnica, (2°) que essa atividade esteja relacionada com a profissão regulamentada e (3°) que essa relação seja de sorte tal que o exercício da atividade demande conhecimento técnico-científico obtido, com exclusividade, nos cursos de formação da profissão.
Brevemente posto isto, o CFN examina então as condições em que a lei confere aos nutricionistas – profissionais registrados nos Conselhos Regionais de Nutricionistas – o privilégio do exercício das atividades de magistério das disciplinas e matérias relacionadas à alimentação e à nutrição.
O art. 3° da Lei n° 8.234 não deixa dúvidas quanto ao fato de que as atividades de docência, em se tratando de “matérias profissionais dos cursos de graduação em Nutrição” (inciso IV) e das “disciplinas de Nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins” (inciso V), constitui privilégio dos nutricionistas. Não é por outra razão que o caput do artigo refere que “são atividades privativas dos nutricionistas” aquelas que relaciona, aí incluídas as de ensino referidas nos incisos IV e V.
A determinação legal quanto à reserva das atividades de docência aos nutricionistas está amparada em fundamentos lógicos. Decorre da conjugação de duas premissas básicas. A primeira é genérica e aplica-se a toda atividade de ensino, e vem a ser a exigência de transmissão de conhecimento correto, capaz de proporcionar ao aprendizando a absorção de técnica que lhe permitirá, depois, desincumbir-se de um conjunto de encargos próprios e inerentes ao respectivo ofício. A segunda, que é a que interessa aqui, tem a ver com a origem do conhecimento a ser transmitido, o que leva à exigência de que a transmissão de conhecimento obtido, com exclusividade nos cursos de formação de nutricionistas, só pode ser feita por quem se graduou nos referidos cursos, sob risco de situar o aprendizado no campo da incerteza.
Fazendo um paralelo entre as diversas atividades das profissões e, em destaque, a de ensino, podemos afirmar que naquelas o objetivo desejado pelo destinatário é o resultado útil referido acima, de forma concreta, palpável, que represente uma determinada utilidade. O planejamento, a organização, a direção, a supervisão e a avaliação de serviços de alimentação e nutrição (Lei n° 8.234, art. 3°, II) constituem exemplos de atividades que proporcionam utilidades concretamente avaliáveis no contexto do exercício da profissão de nutricionistas.
Da atividade de ensino o que se deseja também é um resultado útil, que se efetiva na absorção de conhecimento. Todavia, o resultado da atividade de ensino é um bem de conteúdo imaterial, o que remete a comprovação ao processo de aferição de conhecimentos e à prática do dia-a-dia. Assim, se para as atividades concretamente verificáveis se exige a participação de profissional habilitado – conseqüência do privilégio – como pressuposto do resultado útil, outro tanto se deve exigir das atividades de ensino, cuja maior garantia do resultado é justamente a certeza de que o conhecimento a ser transmitido tem origem idônea.
Nestes termos, não restam dúvidas de que a Lei n° 8.234 está absolutamente correta ao estabelecer como prerrogativa dos nutricionistas o “ensino das matérias profissionais dos cursos de graduação em Nutrição” e o “ensino das disciplinas de Nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins”. Somente esse privilégio legal é capaz de garantir que as atividades de ensino serão prestadas por pessoas que adquiriram conhecimento bastante para ensinar matérias e disciplinas relacionadas à alimentação e nutrição.
Conclui-se, portanto, que somente os nutricionistas estão autorizados a lecionar “matérias profissionais dos cursos de graduação em Nutrição” e as “disciplinas de Nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins”. Outros profissionais que venham a lecionar referidas matérias ou disciplinas cometerão exercício ilegal da profissão de nutricionista.
III) DA DIREÇÃO, COORDENAÇÃO E SUPERVISÃO DE CURSOS
As atividades de “direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação em Nutrição” estão expressamente reservadas aos nutricionistas no art. 3° da Lei n° 8.234.
Também nesse dispositivo a Lei n° 8.234 andou muito bem.
Essas atividades de direção, coordenação e supervisão de cursos de formação, normalmente dos cursos superiores, envolve um ramo administrativo ou gerencial, e outro técnico.
Enquanto atividade administrativa ou gerencial, nenhum requisito se há de exigir dos diretores, coordenadores e supervisores, ao menos em face da legislação reguladora da profissão de nutricionista. Já quanto ao ramo técnico, é notório que a participação do dirigente do curso exige dele conhecimento tal que lhe proporcione fazer, como se espera do cargo, constante avaliação da condição das atividades de ensino sob sua tutela.
Essas atividades de direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação em Nutrição somente poderão ser desempenhadas por quem detenha conhecimento tal que permita uma interação no âmbito das diversas matérias ministradas nos cursos, daí ser razoável exigir-se do dirigente do curso que ele tenha domínio, se não da totalidade das matérias de formação, pelo menos de uma significativa parte delas.
Patente, portanto, que as atividades de direção, coordenação e supervisão dos cursos de graduação em Nutrição somente poderão ser exercidas por profissionais com formação em Nutrição, sendo defeso a qualquer outro profissional fazê-lo. Se a reserva, aos nutricionistas, do exercício da direção, coordenação e supervisão dos cursos não decorresse de lei – mas decorre e por isso é defeso a quem quer que seja contestar sua exigibilidade, como pretexto para descumpri-la -, seria ainda assim exigível pela própria natureza das atividades demandadas aos diretores, coordenadores e supervisores de cursos de graduação em Nutrição.
Conclui-se, portanto, que somente os nutricionistas poderão dirigir, coordenar e supervisionar os cursos de graduação em Nutrição.
IV) DA EXIGÊNCIA DO REGISTRO PROFISSIONAL PARA OS DOCENTES E DIRIGENTES DE CURSOS DE GRADUAÇÃO EM NUTRIÇÃO
As atividades de ensino das matérias e disciplinas relacionadas à alimentação e Nutrição, bem assim as de direção, coordenação e supervisão dos cursos de graduação em Nutrição, têm natureza técnica, como foi aqui demonstrado.
Dessas atividades técnicas o que se deseja é que o resultado seja de modo a atender ao fim idealizado para a atividade. A busca desse objetivo é que motiva na legislação brasileira a regulamentação das profissões e a sua fiscalização por conselhos e ordens de fiscalização profissional. A partir da regulamentação é que a existência de privilégio para o exercício de atividades inerentes a cada profissão ganha forma, na medida em que remete a um organismo corporativo o controle sobre o exercício das respectivas atividades.
No âmbito das profissões regulamentadas cabe a cada organismo criado para fiscalizar o seu exercício desenvolver mecanismos de punição ao exercício inadequado por quem deveria fazê-lo tecnicamente correto – por estar habilitado – e de repressão ao exercício profissional contra aqueles impedidos de fazê-lo, por não estarem habilitados.
As atividades de ensino de matérias e disciplinas relacionadas à alimentação e Nutrição, bem assim a direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação de Nutrição estão reservadas, pela Lei n° 8.234, aos nutricionistas.
Essa mesma Lei n° 8.234 estatui, no seu art. 1°, que “a designação e o exercício da profissão de nutricionista (…) são privativos dos portadores de diploma expedido por escolas de graduação em Nutrição, oficiais ou reconhecidas, devidamente registrado no órgão competente do Ministério da Educação e regularmente inscrito no Conselho Regional de Nutricionistas da respectiva área de atuação profissional”.
Vê-se então que o art. 3° da Lei n° 8.234 prevê serem privativas de nutricionistas aquelas atividades nele elencadas, enquanto que o art. 1° estatui que “a designação (…) de nutricionista (…)” é privativa dos portadores de diploma “registrado no órgão competente do Ministério da Educação e regularmente inscrito no Conselho Regional de Nutricionistas”.
Disso decorre que, a uma, somente os nutricionistas é que podem exercer – além das demais – as atividades relacionadas nos incisos I, IV e V do art. 3° da Lei n° 8.234; a duas, somente são considerados Nutricionistas aqueles graduados que, além de terem seus diplomas devidamente registrados no órgão competente do Ministério da Educação, estejam regularmente inscritos no Conselho Regional de Nutricionistas.
Não basta, portanto, que o profissional seja graduado em Nutrição; para exercer as atividades privativas descritas no art. 3° da Lei n° 8.234 deve ser Nutricionista, sendo que só será assim designado o profissional detentor de registro junto ao Conselho Regional de Nutricionistas da região onde a profissão está sendo exercida. A este Conselho caberá a fiscalização da profissão, múnus público que não se confunde com a fiscalização da atividade de ensino, que é reservada aos órgãos de fiscalização do Ministério da Educação.
Nos termos ora aduzidos é de se concluir que os docentes e os diretores, coordenadores e supervisores de cursos devem estar registrados no Conselho Regional de Nutricionistas da região onde cada uma dessas atividades é exercida.
V) CONCLUSÃO
Em consonância com o aqui exposto, o CFN finaliza respondendo os quesitos elaborados para orientar o exame feito neste parecer.
Quesito I:
I) As atividades de ensino de matérias e disciplinas relacionadas à alimentação e à nutrição são privativas de mutricionistas?
A resposta é sim. O privilégio conferido aos nutricionistas para ministrarem “matérias profissionais dos cursos de graduação em Nutrição” e as “disciplinas de Nutrição e alimentação nos cursos de graduação da área de saúde e outras afins” decorre, primeiramente, das próprias atividades, que têm natureza técnica e, depois, da expressa disposição contida no art. 3°, incisos IV e V da Lei n° 8.234.
Quesito II:
II) As atividades de direção, coordenação e supervisão de cursos nas áreas de Nutrição são privativas de nutricionistas?
A resposta também é sim. O privilégio conferido aos nutricionistas, para o exercício das atividades de “direção, coordenação e supervisão de cursos de graduação em Nutrição” está expresso no art. 3° da Lei n° 8.234, o que por si só já afasta conduta contrária. Ademais, as atividades têm natureza técnica, exigindo que a designação recaia sempre em profissional habilitado, no caso os nutricionistas.
Quesito III:
III) Os docentes e os diretores, coordenadores e supervisores de cursos de graduação em Nutrição estão sujeitos ao registro nos Conselhos Regionais de Nutricionistas e ao cumprimento de obrigações decorrentes desse registro?
Mais uma vez a resposta deve ser sim. A Lei n° 8.234 reserva aos nutricionistas as atividades de ensino e as de direção, coordenação e supervisão dos cursos; e nutricionistas são exclusivamente aqueles registrados nos Conselhos Regionais de Nutricionistas. Logo, somente os profissionais registrados – porque somente estes são nutricionistas – é que poderão exercer as atividades referenciadas. Sendo exigido desses profissionais o registro no Conselho Regional de Nutricionistas, decorre daí a obrigação de eles pagarem as anuidades e atenderem às demais obrigações inerentes ao registro.
Fora as conclusões expostas pelas respostas aos quesitos, o CFN salienta que tanto a reserva de atividades de ensino e as de direção, coordenação e supervisão de cursos aos nutricionistas, bem assim a exigência do registro profissional estão, em derradeira análise, previstas nas Leis n° 6.583 e n° 8.234, o que faz estas normas compatíveis com as disposições do art. 5°, incisos II e XIII da Constituição do Brasil.
CONSELHO FEDERAL DE NUTRICIONISTAS